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O prazer da inutilidade

O prazer da inutilidade

TEXTO POR BARBARA ALBUQUERQUE
 À minha frente, um auditório cheio de idosos [...]: 
"Senhoras e senhores: então vocês chegaram
finalmente à idade em que podem se dar ao
luxo de ser totalmente inúteis…" Rubem Alves

Nesse momento de quarentena, quando boa parte do país – e do mundo – se encontra dentro de casa, trabalhando do seu computador ou aguardando a quarentena acabar para retornar ao trabalho, é impossível deixar de refletir sobre o frenesi a vida que levamos…

Do lado de cá, independentemente do que decidimos fazer com esse tempo, com essa sobra de tempo, continuamos aguardando com o sentimento de que é apenas isso que nos resta: aguardar. E parece que ninguém está acostumado a observar o tempo passar.

Para aniquilar essa sobra sem definição, nos propomos a colocar em dia a faxina da casa, os estudos, as pequenas reformas não feitas, projetos de “faça você mesmo”, nos livrar dos papéis acumulados… Tivemos um boom de aplicativos que eram pagos e se tornaram gratuitos para que as pessoas tenham o que fazer: exercícios para manterem a academia em dia, podcasts, vídeos-aula e outra infinidade de utilidades.

Fica então, implícito nessa mensagem, a ideia de que temos que ser úteis, mesmo em momentos como esse. Que temos que produzir e que o show não deve parar. Mas o útil nem sempre é belo e com menor frequência ainda nos dá prazer. Com o turbilhão que acontece dentro de nós, quem nos convenceu de que temos que ser úteis?

Esse texto começou com uma citação de Rubem Alves em uma palestra que ele deu a um auditório cheio de idosos. Onde ele disse que, na velhice, podemos nos dar ao luxo de sermos inúteis. Veja bem: um rolo de papel higiênico é muito útil, ler um livro de literatura nem tanto; uma vassoura e uma faxina na casa é muito útil, abraçar quem se ama nem tanto…

Todos temos nos sentido um pouco velhos nesse novo cenário, preocupados com essa sobra de tempo que é tudo nos restou. E pode haver uma inutilidade nesse momento. Muitas coisas, apesar de inúteis, nos dão grande prazer, e cada um sabe bem daquilo que lhes dá prazer. Minha proposta é que, durante esse tempo, dediquemos uma parte do nosso dia para a inutilidade bela e prazerosa que a vida pode nos proporcionar.

Para finalizar, Victor Hugo, na sua grande obra (em tamanho e esplendor) “Os miseráveis”, nos conta de um bispo que plantava muitas rosas em seu jardim. Certo dia, sua governanta lhe diz: “”Monsenhor, o senhor, que tira proveito de tudo, tem aqui um canteiro inútil! Mais valeria plantar saladas do que flores”. “Senhora Magloire”, respondeu o bispo, “a senhora está enganada. O belo é tão útil quanto o que é útil”. E após um momento de silêncio acrescentou: “Até mais, talvez””.

Me despeço assim: escrevendo esse texto inútil.