Meu interesse pela psicanálise surgiu através da leitura de colunas do psicanalista Contardo Calligaris na Folha de São Paulo. Contardo era mestre na arte de fazer a gente mudar o ângulo com que enxergamos certas situações, sem tentar impor uma visão de mundo. Um tempo depois de conhecer seus textos, fui convencida de que um psicanalista poderia me ajudar diante de uma sensação que sentia, sensação de estar num beco sem saída, que passou a ficar insuportável pela quantidade de tempo que esse ciclo repetitivo me tomava. O beco na verdade era um grande labirinto. Mas só pude ler assim com a ajuda da psicanálise. Aliás, psicanálise tem tudo a ver com leitura! Ainda que não sejamos tão leitores assim.

Por que não só livros, mas também quais músicas, novelas, desenhos animados, provérbios constituem nossas histórias e dão o tom de como as vivemos? Em algum momento do trabalho de uma análise, essas coisas, aparentemente “bobas”, começaram a dar notícias de nós (ou melhor, da forma que escolhemos contar quem somos). Hoje, depois de dez anos de análise e quase a mesma quantidade de tempo de formação psicanalítica, resolvi ingressar num mestrado em Psicanálise: Clínica e Cultura (UFRGS), onde pesquiso como diferentes formas de ler conceitos-chaves na teoria psicanalítica promovem diferentes tipos de clínica (vê? psicanálise tem tudo a ver com leitura!). É que acredito que algumas decisões de leitura podem piorar um sofrimento. Foi o que aprendi de mais importante até hoje na minha experiência como analisante e como analista. Diferentes decisões de leitura promovem diferentes direções da cura.

É possível mudar nosso ângulo de enxergar as coisas, sem que uma visão de mundo nos seja imposta. Essa é minha ética de trabalho.