Na atualidade, observamos um agravamento das manifestações de melancolizações ou depressões, não só em decorrência da pandemia de Covid-19, mas também pelo contexto sociocultural na contemporaneidade. Fatos esses que são possíveis de serem localizados em artigos e notícias bem como nos últimos estudos da ONU (2020) que já vem anunciando um aumento dos quadros depressivos, ansiedade e suicídio em países como o Brasil, e suas consequências na saúde mental. A ONU também alerta sobre a necessidade de ações e investimentos nesta área, em função de ter se tornado um problema de saúde pública.
O alerta que precisamos fazer, diz respeito a olhar os sintomas depressivos para além do discurso médico que trata a depressão como um transtorno mental e o tratamento consiste em reduzir ou eliminar sintomas, como pode ser observado no DSM-V, por exemplo. Sabemos que em alguns casos existe a necessidade de tratamento medicamentoso, mas nesse contexto, corre-se o risco de marcar a patologização dos sintomas depressivos.
Desta forma, propomos pensar o sofrimento psíquico relacionado ao campo social que nos possibilita observar e refletir sobre o mal-estar em que se deparam os sujeitos em nossa época, uma vez que o modo como se vive hoje, coloca em xeque o próprio sentido de nossa existência, desencadeando resignação no sujeito para com ele mesmo e para com os outros, distanciando-o de si mesmo. Nesse sentido que muitos acabam se isolando do convívio, mergulhados em angústia ou numa certa apatia, perdendo a condição de desejante.
Assim, na clínica psicanalítica temos refletido sobre algumas condições preocupantes, entre elas: a condição da psicopatologia contemporânea que promove uma anestesia psíquica e anulação da subjetividade, numa cultura que, em seu discurso, desconsidera o saber do inconsciente, enfatizando uma demanda de um gozo-todo (Besset, 2002). Em outras palavras: um discurso que impulsiona o sujeito para o prazer sem limites, para o consumismo (prazer com as compras e compulsões como pelo álcool e drogas), para a cultura do corpo (ideal de juventude e beleza estética e “corpo perfeito”) e para a ideia de performance (excelente desempenho profissional e pessoal).
Esses são alguns apontamentos para pensar a fragilidade nos laços sociais em que vivemos, sendo que tais condições são geradas pelo discurso capitalista predominante na contemporaneidade (Quinet, 2020) que trouxe mudanças, principalmente a partir das Revoluções Industriais (mudanças das técnicas, das tecnologias e do modo de produção), sendo algumas dessas mudanças: a aceleração do tempo, o imediatismo, a impaciência, a rapidez na realização de ações, entre outras. O homem passa a ser tratado como objeto, como uma coisa e não como um sujeito e, obviamente, que isso produz consequências e sofrimento psíquico e entre elas a angústia e manifestações de sintomas depressivos. Nesse sentido que podemos entender a depressão como um sintoma social, como bem descreveu Maria Rita Kehl em seu livro “O Tempo e o cão (2015).
Que essas breves reflexões possam contribuir para que as pessoas que encontram-se em sofrimento psíquico, busquem ajuda especializada e nesse sentido o tratamento psicanalítico é bastante recomendado.
Referências:
Besset, V. L. (2002) A Clínica da Angústia. São Paulo: Editora Escuta.
Kehl, M. R. O tempo e o cão: a atualidade das depressões. 2ª ed. São Paulo: Boitempo, 2015.
Organização das Nações Unidas: “Policy Brief: COVID-19 and the need for action on Mental Health”. Disponível em https://nacoesunidas.org/page/12/
Quinet, A. (n.d.) A ciência Psiquiátrica nos discursos da contemporaneidade. Estados Gerais da Psicanálise. Disponível em www.egp.dreamhosters.com