Para muitos pode ser controverso falar da clínica social em psicanálise, pode-se falar que a psicanálise faz uso de uma pergunta que torna o tratamento possível para várias realidades – quanto você pode pagar? – Mas quem chega a ouvir essa pergunta? Quem de fato adentra as portas dos consultórios particulares? Tenho visto a clínica social se construir como raízes, enraizando onde a terra está marginalizada, crescendo em direções impossíveis, fazendo flor e fruto onde muitos julgam árido. De um lado, ouço de várias bocas, em diversos contextos e a psicanálise custa caro, que ir ao analista custa muito caro. O quanto é muito? Qual é o parâmetro? O que custa tão caro? De outros lados, ouço que a psicanálise não faz uso dos termos “clínica social’ e de outros lados mais lados ainda, escuto que nunca tiveram acesso a psicólogos, muito menos psicanalistas, que essas palavras não fazem parte de um dia a dia tão soterrado por uma sobrevivência no sentido mais cru, de um não morrer. Mas como viver? Lugares onde palavras como saúde mental, psicologia e psicanálise são luxos distantes ou ainda cobertas por um véu que as torna invisíveis.
A psicanálise no Brasil carrega historicamente as marcas do elitismo, chegou pela via médica e por muito tempo assim ficou. Hoje em dia podemos presenciar e vivenciar movimentos de democratização da psicanálise (tanto o tratamento quanto a formação) e acredito que abrir um espaço para vestir por um tempo as palavras: clínica social – possa ser um caminho importante, que por esta via, quem antes não alcançava as portas dos consultórios (fora do SUS, que sofre cada vez mais cortes hemorragicamente devastadores) hoje possa ter autonomia e desejo de adentrar, para se apropriar de sua travessia diante da pergunta “quanto você pode pagar?” É preciso ter alguém para ouvir essa pergunta, é importante que seja uma escolha estar ali, que essa escolha não seja invisível e omitida para uma parcela da sociedade. É necessário que a escolha seja as raízes, ventos, ondas, chuvas e dias de sol que chegam para todos. Não é necessário que todos escolham o mesmo caminho, mas que possam circular entre as escolhas possíveis e, olhando para elas, trabalhar na direção de seu próprio desejo.
Por fim, que a psicanálise possa ser um caminho possível: desejar e lutar para que esta frase seja democratizada em ato é algo que faz desmoronar o véu de exclusividade e que pode causar terremotos em vários terrenos, pois que assim seja, que a psicanálise através da clínica social possa implodir estruturas rígidas e elitistas, que possa fazer areia das pedras que impedem o caminho, para pavimentar o solo de cada um. A travessia é difícil, desafiadora e libertadora, que um psicanalista possa te acompanhar nessa travessia, se assim desejar.