Esses tempos fui convidada para um bate-papo para falar sobre “como lidar com nossos medos”. Depois de ter aceitado o convite, me peguei pensando como poderia eu, que tenho tantos medos, falar sobre como lidar com eles. Conversando com uma amiga bem especial, ela me lembrou que era justamente por enfrentar tantos medos que eu poderia falar disso. Foi a partir deste lugar que eu engatei numa conversa super legal sobre a travessia dos medos – em tempos de pandemia ou não. Percebi que eu não estava lá para dar uma resposta que fosse uma verdade absoluta à qualquer questão, mas, poder, junto, dar contorno a tantas perguntas, de forma que fosse possível inventar jeitos de seguir adiante, continuar caminhando.
O medo é um afeto, que tem relação com situações de perigo ou ameaça e a forma como elas nos afetam, causando sensações, sentimentos e emoções desagradáveis – frio na barriga, tremedeira, pensamentos ruins, suor excessivo. Por isso, parece ser sempre algo a ser eliminado, que não deveria ser sentido. É comum quando alguém nos diz que está com medo – seja adulto ou criança, que a gente responda: “não é nada”, “vai passar”, “que bobeira”.
Com isso, não estamos, de fato, enfrentando os medos, estamos apenas reforçando a ideia de que ele não é bom, que não deve existir, que não pode ser dito ou sentido. Principalmente, com isso, acabamos por invalidar a experiência que aquela pessoa enfrenta, passando a ideia de que ela não tem recursos para lidar com a situação. Mas, se o medo é o afeto diante do perigo ou ameaça, ele é parte importante das nossas experiências – afinal, precisamos saber reconhecer um perigo para podermos nos proteger dele.
Assim, um pouco de medo é importante para trilharmos nossos caminhos. O que é ruim é o medo que causa sofrimento exagerado, o medo que paralisa. Descobrir como usar o medo a nosso favor, de um jeito produtivo, é super importante para vivermos boas aventuras por esse mundão. E a coragem aparece nessa descoberta, neste atravessar o medo. Tendemos a achar que ter coragem é não ter medo, mas ela é justamente o enfrentamento dele.
Se as crianças pequeninas quando estão com medo choram, gritam, dizem que estão com medo, tremem, os adultos, tomados pelo equívoco de que “o medo não é bom”, acabam por disfarçar o medo, fingir que “está tudo bem”, “ser forte”. Mas, é só um disfarce, afinal, não tem um botãozinho que seja capaz de desligar o medo, né!? O problema é que sendo disfarce, o medo continua lá, e acaba por aparecer na forma de raiva, agressividade, tristeza ou mesmo a experiência de muita angústia.
É, o medo, por pior que pareça, está sempre localizado, tem um objeto – não é medo sozinho, é sempre medo de alguma coisa, o que possibilita que falemos dele. Quando não pode ser dito, vira angústia, que é aquela coisa ruim que sentimos, para o quê muitas vezes não encontramos palavras e vira sofrimento no corpo, transtornos ou distúrbios emocionais. Viu só a importância de falarmos do que sentimos?!
Quando a gente fala, se apropria daquilo e aprende a traduzir em palavras, em gestos, o que a gente sente, e, com isso, ganha companhia para atravessar os medos da nossa jornada. Afinal, se não tem como desligar o medo, é melhor que a gente possa atravessá-lo em boa companhia. E o que nós podemos fazer por alguém que sente medo? Não precisa muito mais que segurar na mão, reconhecer que ele existe e que é possível seguir caminhando – com medo mesmo, mas, em boa companhia.