Os vínculos afetivos representam um dos aspectos mais desafiadores e complexos da vida humana. Em um mundo onde as mudanças acontecem em um ritmo cada vez mais acelerado e o distanciamento social é intensificado pelo uso crescente das redes sociais, não é raro se deparar com alguém que se pergunte: “por que os relacionamentos não duram como antes?”.
Para responder a tal questionamento, podemos recorrer a vários caminhos. Mas segundo a teoria psicanalista, podemos explorar alguns elementos que influenciam a forma como nos vinculamos e nos relacionamos a um outro e quais seriam as dificuldades que encontramos para manter vínculos duradouros, profundos e significativos.
O Complexo de Édipo e a Escolha Amorosa
Um dos conceitos centrais da psicanálise é o complexo de Édipo, que por definição, segundo Freud, é um conjunto organizado de sentimentos amorosos e hostis que a criança experimenta em relação às figuras parentais, as quais serão as responsáveis pela constituição de uma rede de representações inconscientes e de afetos. Em outras palavras, as primeiras relações afetivas que desenvolvemos com nossos pais ou cuidadores, moldam, em um nível inconsciente, como iremos nos vincular e construir laços afetivos e amorosos com as pessoas no futuro.
A clássica expressão “dedo podre”, usado popularmente para descrever a escolha recorrente de parceiros disfuncionais, pode ser um reflexo de padrões inconscientes não resolvidos. Quando buscamos no outro a completude que nunca alcançamos em nossa relação com os pais, o relacionamento acaba sendo marcado por frustrações e desilusões. O parceiro, com isto, se torna o receptor de expectativas irreais, gerando decepções que podem culminar em rupturas.
Repetição de Padrões Inconscientes
Outra resposta para esclarecer o motivo pelo qual as relações hoje em dia serem tão curtas e instáveis, é que muitos relacionamentos acabarem repetindo inconscientemente padrões de comportamentos destrutivos. Freud descreveu o conceito de compulsão à repetição, que se refere ao impulso inconsciente de recriar situações de sofrimento já vividas no passado, na tentativa de, desta vez, obter um resultado diferente.
Por exemplo, alguém que viveu em um lar disfuncional pode, em um nível inconsciente, buscar parceiros que recriem os conflitos e tensões familiares que viveu durante a infância, na esperança de resolver o que não foi resolvido no passado. Isso frequentemente resulta em relacionamentos instáveis e insatisfatórios, pois o parceiro atual dificilmente poderá resolver as questões emocionais profundas que são projetadas nele.
O Narcisismo e o Outro
Outro conceito central na psicanálise é o narcisismo. Freud em sua obra Introdução ao narcisismo (1914-1916) cita que todos nós temos uma relação com o nosso próprio ego que, de certa forma, é narcísica. Buscamos, no outro, reflexos de nós mesmos, ou seja, uma idealização que preenche nossas próprias necessidades. Esse fenômeno é evidente quando o casal enfrenta crises, e um dos parceiros (ou ambos) percebe que o outro não é capaz de atender a todas as suas expectativas. Quando este desejo, narcisista, não é satisfeito, surgem então sentimentos de desilusão e frustração, que podem levar ao rompimento.
O Desejo e a Falta
Por fim, podemos buscar respostas para esta questão sobre relacionamentos em Lacan. Este teórico psicanalista traz uma perspectiva valiosa sobre o desejo no campo dos relacionamentos. Para ele, o desejo está sempre relacionado à falta. Em outras palavras, o ser humano está constantemente buscando algo que nunca será completamente alcançado. No contexto dos relacionamentos, isso significa que o desejo pelo outro é sustentado pela ausência, pela impossibilidade de ter seus desejos e necessidades completamente preenchidas pelo parceiro. Essa dinâmica cria uma tensão entre a proximidade e a distância. Quando o desejo é satisfeito completamente, pode surgir o tédio ou a sensação de que algo está faltando.
Com isto, podemos concluir que alguns relacionamentos têm uma duração curta, em parte, porque carregamos para eles expectativas irreais e padrões inconscientes moldados pelas nossas primeiras experiências de apego, e pelos conflitos infantis que não foram resolvidos com as figuras parentais. A psicanálise nos ensina que, enquanto continuarmos a projetar no parceiro a expectativa de completude ou tentarmos recriar dinâmicas familiares disfuncionais, nossos relacionamentos estarão fadados ao fracasso.
Para que os relacionamentos possam se sustentar ao longo do tempo, é fundamental desenvolver uma maior compreensão de nós mesmos e dos padrões de apego que carregamos. A compreensão dessas dinâmicas psíquicas pode nos ajudar não apenas a entender por que os relacionamentos falham e acabam, mas também a desenvolver uma maior autocompreensão e maturidade emocional, permitindo, com isso, um controle emocional melhor com as inevitáveis imperfeições e desafios da vida amorosa.
Por Bruno Eduardo Kolokovski – CRP 08/40543
Psicólogo e Psicanalista