O trabalho se faz presente em nossas vidas desde a infância, ao observar os pais que saem todo dia de casa para trabalhar, ao ouvir os adultos falarem sobre suas profissões, ou ao sermos confrontados com a famosa pergunta: O que você vai ser quando crescer?
Por mais ingênua que pareça a pergunta, ela deixa marcas em quem somos e em quem nos tornamos. Crescemos aprendendo que é preciso escolher uma profissão e, ao fazer essa escolha, é esperado que tenhamos sucesso, reconhecimento, estabilidade financeira — entre tantas outras exigências que acompanham a vida adulta.
No livro O mau estar na civilização (1930), Freud diz que ‘a atividade profissional traz particular satisfação quando escolhida livremente’. O trabalho pode dizer de nós: do que somos, do que fazemos, do que acreditamos, do que gostamos. Mas, e quando deixa de refletir quem somos para se tornar o lugar onde sentimos que fracassamos?
A sociedade contemporânea exige uma performance constante para sermos a melhor versão de nós, e no mercado de trabalho não é diferente: precisamos atingir metas, definir e alcançar objetivos, encaixar no fit cultural, estar constantemente avaliando as próprias qualidades e defeitos — e também os dos outros. Essa exigência para que se atinja um ideal acomete o trabalhador a um nível de cobrança muitas vezes adoecedor, e então o mal-estar aparece: ansiedade antes do trabalho, choro repentino e incontrolável, o corpo cansado pedindo descanso e a mente que já não dá conta de tanta produtividade. A angústia surge e com ela o sentimento de incapacidade, de culpa, de tristeza, de medo.
É importante dar lugar a essa angústia, falar sobre esses sentimentos, nomeá-los, escutá-los e não reduzi-los apenas a uma necessidade de melhorar o desempenho. Eles denunciam aquilo que, dentro de nós, não vai tão bem assim.
O que você será quando crescer?
Como se já não fôssemos alguém na infância. Como se, para sermos reconhecidos como gente, fosse necessário ter uma profissão. Mas já somos. Somos sujeitos que criam, refletem, descansam, se entristecem, se alegram, sentem, amam e odeiam.
Somos feitos de histórias, de afetos, de outras pessoas.
Não somos, e nunca fomos, apenas trabalho.